segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

100 Papas na Língua, por Pedrinho Hallal

Futebol de Mesa

Diz a lenda que o ano era 1980, aliás, o ano em que eu nasci. No meio do mato, vagava um menino com jeito de lenhador. Reza a lenda que ao ver o menino com cara de lenhador, um detector de talentos pensou “imagina esse menino cavando”. Foi assim que começou a carreira de Sérgio Pierobom no futebol de mesa. E a partir daí, acaba a lenda e começa a história a ser escrita. O mesmo menino, no mesmo ano, foi disputar o Campeonato Estadual Especial, e para surpresa de muitos, sagrou-se campeão. O restante da carreira de Sérgio Pierobom dispensa comentários. Basta uma visita aos sites especializados no futebol de mesa (recomendo o http://futmesapedia.com/) que vocês saberão um pouco mais da história desse monstro sagrado. 

Mas peço licença ao meu amigo Sérgio Pierobom para dedicar a coluna de hoje a outro botonista de sua família, o Bicampeão da Academia, Mateus Pierobom, ou simplesmente, Mathias. Chegar ao bicampeonato da Academia, competindo contra verdadeiras lendas do futebol de mesa é algo difícil para qualquer um, mas especialmente para o Mathias. Diferente de toda criança que eu conheço, Mathias foi amaldiçoado na infância da pior forma que uma criança pode ser amaldiçoada. Irritado com a voz fina do menino, Paulo Zilberknop olhou para ele e profetizou, para quem quisesse ouvir: “EU AINDA VOU FAZER ELE CHORAR. EU NÃO TENHO PRESSA”.

Peço a todos os botonistas que acompanham o nosso blog que pensem nisso. Todos sentimos um pouco de medo do Zilber, mesmo sendo uns barbados. Imagina uma criança, indefesa, ouvir uma ameaça dessas. Imagina o tempo de terapia necessário para se recuperar disso. Talvez fosse até necessário abandonar a cidade por um tempo, ir para a praia (Florianópolis, talvez), para somente depois de maduro voltar. E foi isso que o menino Mathias fez.

Nas mesas, Mathias é o mais baiano dos gaúchos. Joga liso como os nordestinos, e não como os gaúchos. É o rei do corte, o rei dos tiros (não estou falando de tiros de meta), o rei das recuadas. Diz a lenda que num jogo decisivo do Centro-Sul Brasileiro num ano desses, o adversário olhou para Mathias e perguntou: “O 7 é atacante, certo? O 14 é atacante, certo? E o 11, é atacante também? O 21 lá atrás, é atacante? E o 26, é atacante?” Indignado ao ouvir cinco SIM seguidos o botonista não aguentou: “Tu tá louco, rapaz? O que é que você está pensando do futebol de mesa?”

Mathias joga com cinco levantadores, todos com nome e sobrenome. Na semifinal contra Augusto, por exemplo, sobrou uma bola, nos pés de David Trezeguet. O desfecho era óbvio. Na final contra Alexandre, Mathias precisava apenas do empate, a pior coisa que pode acontecer com um botonista tipo o Mathias. Ele aprendeu desde pequeno, com o sangue dos Pierobom, de que o jogo é para cima, que o objetivo é o gol (Cauane, favor explicar que nem todos têm o gol como objetivo). Imagina alguém dizer para o Mathias, ou para o Roberto Baggio, que dessa vez eles não precisam fazer gol. Que o empate por 0x0 basta. Isso é quase uma ofensa para alguém com sangue Pierobom. Mas de uns anos para trás, até o Mathias teve que aprender que, às vezes, somente às vezes, o objetivo realmente é não tomar gol.

Parabéns ao campeão Mathias, ao vice campeão Alexandre Gomes, que jogou como campeão, e aos demais finalistas. Foi um sábado inesquecível. A lamentar apenas a péssima arbitragem de Zilber que influenciou de maneira direta o resultado da partida semifinal. Esperamos que o CHEFE, durante 2013, faça um curso com o Maciel para finalmente aprender a arbitrar como antigamente.


Japão

E não é que o Figueira foi campeão do mundo mesmo? Mas eu fico imaginando o Figueira no estádio no Japão, pensando assim no intervalo: “O que é melhor, ser campeão do mundo assim, e aturar o Pedrinho pro resto da vida, ou perder com falha do Cássio, para eu não ter que aturar o Pedrinho?” Para quem não  sabe, faz muito tempo que eu tenho dizendo todas as quintas-feiras que esse tal Cássio é goleiro de seleção, daqueles que disputa 2-3 Copas do Mundo com a camisa amarelinha (ou em 50 Tons de Cinza, como prefere o Cristian Costa).

Durante os debates sobre o assunto, só o Marcelo Vinhas concorda com a minha posição. Os outros, especialmente o Figueira, lançam (lançavam) dúvidas sobre o goleiro. “Ele não sai bem do gol”. “Ele ainda é imaturo”. Essas são algumas das pérolas que tenho que ouvir nas quintas-feiras. Fico com a sensação de que depois de ontem o próprio Figueira vai mudar de ideia.

E vamos combinar que agora, só agora, o Corinthians pode se declarar campeão do mundo. O uso do termo bicampeão, no caso do Corinthians, deveria ser proibido.

 
Centenário Xavante

No dia 07 de Setembro de 2012, o time com a melhor torcida do mundo, completou 100 anos de idade. Muita gente, especialmente de fora de Pelotas, não sabe muito bem o que é ser Brasil. Para esses, sugiro que assistam o DVD que foi criado sobre o Centenário Xavante. Entre muitas estórias, destaco algumas abaixo:

Seletiva para decidir quem representaria a Zona Sul no Estadual de Futsal. Primeiro jogo fora de casa, derrota por 4x3. Segundo jogo em casa, Brasil 2x1. Uma lida no regulamento e ficou claro: a decisão é na moeda. O árbitro vai para o meio da quadra para sortear a moeda. Um dos jogadores do Brasil avisa aos colegas: “Ele vai atirar a moeda, ela vai quicar no chão, e antes que ela pare, vou sair correndo comemorando, e todos devem fazer o mesmo”. O árbitro atira a moeda, que quica no chão e sobe. Nesse exato instante, todo o time Xavante começa a correr no meio da quadra, a moeda desaparece e todos no ginásio têm certeza. Ganhou o Brasil no sorteio. A moeda nunca mais foi vista, o Brasil jogou o Estadual, o autor da façanha nunca mais conseguiu veranear no Cassino.

Brapel no estacionamento da galeteria. Com 15 minutos de jogo, um dos jogadores do Brasil é expulso. Aos 20 minutos, o segundo jogador é expulso. Isso mesmo, teríamos que jogar os próximos 70 minutos (e talvez prorrogação) com 2 jogadores a menos. Logo depois da segunda expulsão, cruzamento na área do Pelotas, gol do Brasil. Saímos ganhando, com 2 jogadores a menos. O Pelotas vem para cima e empata, ainda no primeiro tempo. Começa o segundo tempo e o Pelotas rapidamente vira o jogo. Alguns torcedores ao meu lado dizem que vão embora, para não verem a goleada. Começam pequenas brigas na arquibancada Xavante, ninguém deixando os outros irem embora. O Pelotas tem chance de fazer o terceiro, o quarto, o quinto, o sexto. Mas aos 20 minutos do segundo tempo, o Pelotas tira um meia e coloca um volante. O objetivo passa a ser tocar a bola e esperar o tempo passar. Aos 40 minutos, o Brasil cava uma falta perto do meio de campo. A torcida começa a gritar: “É campeão, É campeão”. Um dos jogadores admitiu no DVD que perguntou ao colega: “Mas o que está acontecendo. Nós estamos ganhando ou empatando?” O colega responde: “Não, nós estamos perdendo. É que eles acham que nós vamos fazer um gol agora”. Cruzamento na área, gol do Brasil. O jogo termina e vai para a prorrogação, com gol de ouro. Um time tem 11 jogadores. O outro tem 9 guerreiros. Por mais impossível que qualquer leitor possa achar, todos no estádio têm certeza de que o Brasil vai sair vencedor. Cruzamento na área do Pelotas, a zaga afasta, Tiago Rodrigues dá um peixinho, o lateral do Pelotas prensa com a trave, gol do Brasil. Isso sim merece DVD (e tem, para quem quiser ver).

O ônibus do Brasil tinha virado. Tínhamos perdido 3 pessoas, sendo o maior craque, um prata da casa e um colega meu, treinador de goleiros. Três semanas depois tínhamos que estrear contra o Santa Cruz no Gauchão. O árbitro determina um minuto de silêncio. A torcida do Brasil simplesmente não consegue fazer um minuto de silêncio. Foi um minuto dos cantos mais apaixonados que já vi na vida, um minuto de lágrimas de todos os presentes no estádio, um minuto que nunca será esquecido. O jogo começa, o Brasil faz 1x0. O Santa Cruz vira. O Brasil desconta. O jogo está 3x2 para eles e o Brasil consegue uma falta na ponta esquerda. Alex Martins, o melhor amigo de um dos falecidos, o jogador mais identificado com a torcida na época, vai para a área. A torcida toda, antes da cobrança da falta, grita: “Alex, Alex, Alex”. Naquele momento, depois de tudo o que passou, a torcida Xavante não se satisfaria com gol do Brasil. Tinha que ser gol do Alex Martins para o Brasil. Bola na área, gol de Alex Martins. Ele sai comemorando chorando, para na frente da torcida, dá três flechadas para o céu, uma para cada amigo que partiu.

Assim é o Brasil. A única torcida do mundo que prevê gols. A única torcida que é apaixonada pelo time, pelo clube e por si própria (Schlee, 2012). Nada se compara. Talvez alguns precisem ouvir os depoimentos de Ruy Carlos Ostermann, Paulo Santana, Luiz Felipe Scolari, Pelé, ou outras pessoas no DVD. Só assim podem entender. Mas se não entenderem nem assim, aí eu só posso lamentar.

2 comentários:

SAMBAQUY, Adauto Celso disse...

Pedrinho,
Maravilhosas histórias que estão em sua coluna. Confesso que fiquei emocionado com as narrativas sobre a torcida xavante. Foi uma descrição tão real e tão forte que emociona a todos. Parabéns.

Pedrinho Gmail disse...

Obrigado Sambaquy. Esse é o Xavante. E ainda existem várias outras histórias, uma melhor do que a outra.